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Opinião Pacifica #2: Era Uma Vez...


"Era uma vez..." é o melhor inicio possível para uma história de encantar. Todos os contos que me lembro de ouvir quando era mais novo, sejam eles contados pela minha avó ou pela minha irmã que aturava-me e ficava de castigo em casa a cuidar de mim, normalmente, contos da Disney, começavam esta mítica frase. Esta frase que sempre fez-me sonhar e fez-me acreditar que tudo era possível, bastando apenas algumas condicionantes para tal.

Alguns anos depois, acordo para aquilo que viria a tornar-se a maior paixão da minha vida e, coincidentemente, também tinha histórias de encantar, guerreiros fortes e corajosos a lutarem contra vilões vis e temíveis. Pelo menos era assim que eu via nessa altura, com os meus nove ou dez anos, em 2006. Quando eu acordei para o Wrestling, lembro-me de sentir-me atraído pelas personagens da altura: HHH, John Cena, Rey Mysterio, Undertaker e HBK e Batista (apesar de já naquela altura achar este ultimo bastante aborrecido em ringue).

Lembro-me de odiar com uma paixão incrível todos os "maus", o EDGE, O Randy Orton, o Umaga, o KIIIING BOOKAAAAA! e por ai. Era o fã de wrestling perfeito que amava os bons e odiava os maus. Ainda lembro-me de muitas vezes a minha mãe ir ao meu quarto e dar comigo a gritar para a minha televisão pequena que tinha, não maior que o ecrã do computador para o qual estou a olhar neste preciso momento.

Eu ali a gritar e a dizer aos bons para não desistirem e aos maus que eles prestavam, como se eles me ouvissem. Atenção, como eu disse, tinha nove ou dez anos. Não era burro, não era parvo, era uma criança que tinha acabado de descobrir o amor da sua vida.


Mas o que me apaixonou realmente naquela altura? Na altura não sabia descrever, mas hoje sei. As histórias. A história do John Cena enquanto ele subia ao topo da empresa. A história do Rey Mysterio e a sua rivalidade com Chavo Guerrero. EDGE e Randy Orton a criarem os Rated RKO e eu a odiá-los fortemente mas no fundo a achar que aquilo que eles faziam era badass como tudo. Os DX a re-aparecerem pouco depois de eu começar a ver.

O Umaga a tornar-se no monstro que era. A Feud entre Batista e King Booker e toda uma coisa chamada Undertaker. Tudo aquilo fascinava-me porque relembrava-me as histórias de encantar que ouvia quando era criança, mas agora, em ponto real e com pessoas verdadeiras. O Wrestling veio ajudar-me imenso, numa altura em que necessitava, deixava-me distraído nem que fosse um par de horas por dia, dois ou três dias por semana.

E porque eu gosto de fazer isto, vamos mudar de tema assim do nada, mas mais tarde vão perceber que tem a ver com aquilo que tenho estado a falar. À doze anos atrás, Portugal perdia o Euro 2004 para a Grécia. Tinha-mos a Geração de Ouro, a melhor seleção que alguma vez tivemos, os melhores jogadores individualmente e coletivamente. Um treinador que sabia cativar o povo e os jogadores, um treinador que mantinha a esperança viva. Um Europeu em casa, destinado a ser nosso. Perdemos o primeiro jogo contra uma Grécia que tinha um futebol feio, defensivo, resguardado e nada atrativo.

O primeiro balde de água fria. Jogamos o resto do Europeu de Futebol imaculados, com um futebol bonito, a jogarmos com grandiosidade e a deitar por terra as grande seleções, os grandes favoritos, como Inglaterra e Holanda. Chegámos à final e o povo já cantava vitória ainda antes do jogo começar. Quem enfrentávamos? A Grécia, os mesmos que nos deram a única derrota neste Europeu e que tinham tido um percurso nada impressionante, passando em segundo lugar no seu grupo e tendo adversários relativamente mais fáceis que nós.

Chegando à hora da verdade, perdemos. Perdemos contra uma seleção bastante mais fraca, com muito menos talento e valor. Ficamos deitados por terra, a perdermos a nossa primeira final e ainda por cima em casa. Os Gregos não mereciam aquela vitória, eles jogavam feio, defensivamente, não jogavam "verdadeiro futebol" como nós... mas a verdade, é que ganharam. Um jovem Cristiano Ronaldo saia do campo em lágrimas, devastado com a derrota, assim como todos os portugueses adeptos do desporto rei.


Passam-se doze anos, doze longos anos em que não ganhamos nada. A seleção está longe de ser o que era e o povo está longe de estar tão ao lado da equipa como estava à doze anos atrás. O futebol da seleção está longe de ser tão bonito como era à doze anos atrás e, mesmo nós tendo o melhor jogador do mundo, o povo só o critica e critica os outros jogadores.

Um por ser um frangueiro, o outro por ser um arruaceiro. Um por ser um cigano e alguns por apenas terem nome e não terem feito nada a época inteira. Mas dois são especialmente criticados: o primeiro, Éder, por ser um cone de estrada, um poste no meio do campo, por não saber jogar à bola, por ser o pior avançado de sempre da seleção, por não merecer a convocatória. O segundo é Cristiano Ronaldo, por ser um arrogante, por não passar a bola, por não correr tanto como corre no Real Madrid, por não ser o grande jogador que diz ser, por ser um péssimo capitão, por isto e porque aquilo. Começamos o Europeu no grupo mais fraco.

Muitos ficaram esperançados mas outros, mesmo assim, eram pessimistas e diziam que nem, a fase de grupos íamos passar. Passamos, mas à rasquinha, em terceiro lugar. O povo gozava com a seleção, que era um bando de fracos que não sabiam jogar à bola e que no grupo mais fraco, passou em terceiro lugar, algo impensável à doze anos atrás. Por ficarmos em terceiro lugar, tivemos a sorte de termos pela frente, seleções teoricamente mais fracas. As grandes equipas ficaram todas no outro lote.

Os favoritos como a Alemanha, a Espanha, a Itália e a França iriam-se comer umas às outras enquanto nós íamos tendo pela frente a "segunda linha" da Europa como a Croácia, Pais de Gales ou a Polônia. Outra vez, íamos acumulando empates e vitórias depois dos 90 minutos. A seleção não sabia atacar, não sabia construir o jogo e defendia demasiado, à semelhança do que a Grécia fazia à doze anos. Até que, de repente, sem nos apercebermos, estamos na final. O povo ficou feliz, mas sempre com o pé atrás. Tínhamos pela frente a França, uma seleção que tinha jogado um excelente futebol e era a Anfitriã.

Toda a gente sabia que era difícil ganhar a final, mas era uma repetição do jogo de à doze anos. A campeã anfitriã, mais forte, com uma nação por detrás, com um futebol bonito, com uma equipa de sonho, Portugal, a equipa visitante, uma equipa mais pequena, com uma seleção com bastantes falhas, a jogar defensivamente, a não impressionar e com o próprio povo a não acreditar.

Mas existia um outro fator nesta final. Em França, nomeadamente, onde foi a final, Paris, estava minada de portugueses imigrantes. Pessoas que tiveram que fugir do seu pais para este para poder ter uma vida melhor. Pessoas que são desrespeitadas todos os dias por serem portuguesas, são menosprezadas, servem apenas para puxar carroças e vêm de "le petit Portugal" (o pequeno Portugal"^). Ou seja, o próprio povo português era subvalorizado e menosprezado, assim como a seleção. É mesmo uma verdadeira história de underdog, construída sobre a história de uma gloria antiga que acabou magoada.

Chegámos à final e começamos mal, começamos o jogo mal, pessimamente e com uma grande perca: Ronaldo, o capitão, o melhor jogador, foi a baixo. Foi lesionado com gravidade e está fora. Ele ainda tentou voltar a campo, lutou mas não conseguiu, as dores eram muitas. Este abandonou o relvado em lágrimas e uma nação começava a perder as poucas esperanças que ainda tinha. A primeira parte passa e mal nos aguentámos, conseguimos segurar o empate nem sabíamos bem como. Na segunda parte as coisas mudaram.

A seleção voltou do balneário diferente, com outra motivação. O discurso do treinador parece ter abalado as coisas. A seleção começou a jogar com outra força e começava a voltar ao jogo. Começávamos a encostar o adversário às cordas e a agarra-lo pelo pescoço (literalmente, o cigano quase que ia safando os brincos ao francês xD). Chegamos ao final dos 90 minutos e empatamos outra vez, mas desta vez, não éramos nós que tínhamos a pressão, não éramos nós que tínhamos que, supostamente, vencer o adversário no tempo regulamentar, pois pela primeira vez, não éramos os teóricos favoritos.

O prolongamento começou e Ronaldo vem para a zona do banco de suplentes e, como verdadeiro capitão, dá um apoio incrível à equipa. O homem que tinha sido lesionado e não podia jogar, tornou-se o décimo segundo jogador da equipa com uma motivação enorme. Éder já tinha entrado, o tal "pino de sinalização", e o povo injuriava a sua entrada, dizendo que este iria estragar tudo. Ao minuto 109, era o próprio Èder que marcava o primeiro e único golo do encontro.

O jogador que mais foi criticado e questionado por ter sido convocado era aquele que dava a vitória à seleção. Ronaldo foi a alma da seleção e a seleção francesa saia derrotada na sua própria casa. Era uma autentica repetição da final de à doze anos atrás. Ronaldo voltou a chorar mais uma vez, mas desta vez, era de alegria e emoção. Foram doze anos a construir esta enorme história de felicidade, uma história de redenção, esta... história.


Eu nem ligo muito ao futebol, mas algo este ano fez-me dar importância ao Europeu de futebol. Algo que nem o próprio wrestling, pelo menos a grande companhia, andava a dar-me à algum tempo... uma história. É incrível como o mundo real consegue dar-nos grandes histórias como esta, histórias de redenção e de um underdog. Mas o Wrestling que, NEWSFLASH, é predeterminado, falha em dar uma história de qualidade equiparável a esta.

Tudo nos últimos tempos tem parecido pouco, existem histórias mas não são boas o suficiente e quando são, acabam por falhar na concretização (Ex: Ambrose vs Lesnar e Jericho vs Styles na Mania). Outros exemplos, como a ascensão e a queda de Connor McGregor, num desporto parecido com o wrestling mas diferente em muitos aspetos e um rival da companhia de Vinnie Mac, mostram que as histórias de qualidade atraem o publico muito mais que combates de qualidade, infelizmente mas compreensivelmente. Por isso, a WWE não pode apenas ir buscar todas as estrelas de topo dos independentes e do Japão e não as souber utilizar em histórias coesas e de qualidade.

O wrestling está a evoluir, como tudo, mas uma coisa que nunca irá mudar é que, sem uma grande história, uma grande storyline de qualidade a acontecer, a companhia perde interesse dos fãs. A ultima grande história de sucesso que atraiu os fãs e agarrou-os ao televisor foi a ascensão de Daniel Bryan e, mesmo isso, foi condicionado pela lesão do próprio quando tudo estava a dar frutos com a vitória deste na Wrestlemania XXX.

Desde ai a WWE tem tentado recriar histórias de qualidade, como Roman Reigns vs Autoridade ou o reinado heel de Rollins, mas a verdade é que não têm tido grande sucesso. O Wrestling é uma das minhas verdadeiras paixões e ver a incapacidade da maior empresa do mundo em concretizar aquilo que mais chama pessoal a ver o produto faz-me cada vez virar para empresas mais pequenas.

Empresas como a EVOLVE Wrestling, que conta com um excelente booker, um aprendiz de Paul Heyman, Gabe Sapolsky, que estão a conseguir contar duas das melhores histórias no wrestling atualmente, com o reinado de Timothy Thacther, um campeão de orgulho ferido, fraco e que está a tentar redimir-se contra um grupo de lutadores puros, uma Stable chamada CatchPoint que têm a filosofia de melhorarem a cada combate e a aprenderem com as derrotas, algo inovador no mundo do wrestling, ou com a storyline de EC3 e Drew Galloway a atacarem a companhia, afirmando que a parceria que esta tem com a WWE está a matar o wrestling independente e que eles conseguiram sair da WWE e ter sucesso cá fora, sem a companhia.


Empresas como a PROGRESS Wrestling que fez um excelente trabalho o ano passado com o reinado do sadístico vilão Jimmy Havoc e ao lançar o talentoso Will Ospreay para as luzes da ribalta quando finalmente pôs fim ao reinado de dois anos do campeão. Empresas como a NJPW que baseiam as suas histórias em competição, como se fosse uma fusão de Wrestling e MMA, dando aso a grandes combates acontecerem e a histórias do estilo de McGregor aparecerem, mas sempre com um pouco de entertainment envolvido, como por exemplo nos grupos Bullet Club ou Los Ingobernables que são um pouco mais trabalhados.

A Lucha Undergroud está a fazer furor e a solidificar-se com um dos melhores produtos do mundo ao trazer um estilo completamente novo de programa, com a edição de um filme de Hollywood e histórias construídas em base de personagens com personalidade e profundidade suficiente para captar os fãs. Até a própria TNA, que não tem tido o melhor produto nos últimos anos, conseguiu voltar às luzes da ribalta com uma das melhores histórias dos últimos anos, na minha opinião. com esta coisa do Hardy vs Hardy.

Toda a gente, cada vez mais, está a apostar em histórias de qualidade, inovadoras e que tragam o publico de volta. A WWE já fez o primeiro passo nessa direção com o Brand Split e a surpresa de termos Dean Ambrose como campeão, mas será que eles vão saber aproveitar este bost que vão ter e apresentar histórias de qualidade? Será que a maior companhia do mundo vai fazer jus ao seu nome e mostrar que tem qualidade para ser intitulada de tal? Ou será que cada vez mais veremos as pequenas companhias a crescer e daqui a 10 anos, o monopólio da WWE irá finalmente estar em risco e teremos outras empresas ao nível da gigante do wrestling?

O meu nome é Marco Paz, eu sou o vosso cronista de hoje. O tema foi um pouco diferente, mas é mesmo isso que eu quero trazer-vos aqui, temas diferentes. Não estou aqui para repetir o que já foi dito 1001 vezes, mas sim para trazer uma visão diferente, uma opinião, por vezes, problemática, uma Opinião... Pacifica. Fiquem bem e não percam a próxima edição porque eu... TAMBÉM NÃO!
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