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Literatura Wrestling | Yes! My Improbable Journey to the Main Event of Wrestlemania - Capítulo 10 - Parte 3


Está de volta a Literatura Wrestling, o espaço de traduções do blog que vos traz uma obra biográfica, na íntegra, reveladora das origens, vida e decorrer da carreira de alguns dos mais marcantes wrestlers que percorreram os ringues que acompanhámos com tanto gosto.

Todas as semanas vos traremos um excerto do livro "Yes!: My Improbable Journey to the Main Event of Wrestlemania", publicado em 2015 por Daniel Bryan e pelo co-autor Craig Tello, a contar o crescimento e peripécias do "Yes! Man" até à sua chegada à WWE e ao main event da Wrestlemania. Boa leitura!


(...)

Ao contrário da Frontier Martial-Arts Wrestling alguns anos antes, quando a New Japan me disse que estava interessada em trazer-me de volta, eles realmente o fizeram. Juntei-me a eles para mais duas digressões, no início de 2003. A série inicial de espectáculos em Março foi relativamente calma, sem grandes acontecimentos, embora enquanto estive em digressão, conheci o TJ Wilson (agora Tyson Kidd) pela primeira vez, e voltei a juntar-me ao Scott Norton, que tinha estado na minha tour inaugural com a New Japan em 2002. Scott, um enorme Campeão Mundial de braço-de-ferro, era um tipo óptimo de se andar por perto. Dado que era um regular na New Japan desde 1990, ensinou-nos muitos truques sobre como sobreviver no Japão. Ele mostrou-nos como chegar aos ginásios independentemente, mostrou-nos alguns excelentes restaurantes perto dos nossos regulares hotéis, e informou-nos sobre os trabalhos internos da New Japan, politicamente falando.

Scott brincou dizendo que se eu tivesse vindo para a New Japan uns quatro ou cinco anos antes, ele e outros gajos ter-me-iam forçado a beber. Felizmente, havia muita menos pressão para um abstinente como eu, porque o Scott era o veterano "gaijin", (o que os Japoneses chamavam a todos nós estrangeiros) e ele próprio tinha deixado de beber inteiramente. Ele disse-me, "Miúdo, não te posso obrigar a beber, mas posso fazer-te beber isto!" Com isso, pagou-me o meu primeiro café. Estive eléctrico durante horas.

Em Maio, fui para fora para outra digressão curta de apenas dois ou três espectáculos, um dos quais era no Tokyo Dome de novo. Desta vez, em vez de estarmos no show principal, estávamos num espectáculo no dia anterior que apenas tinha três combates e que também era a meio de um torneio pachinko, que era uma forma de jogo Japonesa que eu nunca entendi muito bem. A preparação para o nosso espectáculo foi memoravelmente esquisita. Fora do ringue havia algumas centenas de cadeiras, mas também havia um monte de máquinas pachinko, que ocupavam mais ou menos o espaço do tamanho de um ginásio de liceu - tudo ali bem no centro do gigante Tokyo Dome.

Nessa noite, o TJ Perkins lutou primeiro e depois o Rocky Romero e eu fizemos equipa contra o Masahito Kakihara e o Akira, e admito que lutar num estádio tão grande, com tão poucas pessoas, sente-se estranho. Quase teria preferido lutar num parque de estacionamento do Walmart, dos dias em Memphis. O combate não pegou fogo ao mundo, considerando que o Kakihara e o Akira esforçaram-se tão pouco nele. Os nossos adversários nem pareciam querer estar ali, como se fosse uma despromoção para eles estar a lutar neste espectáculo, no dia anterior ao "verdadeiro" grande show. Agora, tendo experienciado muito mais na minha própria carreira, simpatizo completamente com eles.

Quando voltámos ao hotel, Justin McCully mandou-nos reunir-se com ele no seu quarto. Os três (eu, Rocky e o TJ) ali estávamos enquanto Justin nos dizia o quão desiludido Antonio Inoki estava com o combate. Depois esbofeteou-nos. A cada um. Se isso me acontecesse hoje, instantaneamente dava-lhe um murro na cara - o que certamente acabaria comigo a levar uma sova, visto que mesmo nessa altura, o Justin já tinha lutado na UFC (Ultimate Fighting Championship) e era um peso pesado.

Eu estava confuso e não inteiramente certo do que tinha feito de tão errado para merecer um estalo. Justin explicou-me que o estalo foi do Inoki porque ele achou que devíamos ter praticado mais o estilo de luta "shoot" praticado no dojo. De acordo com ele, Inoki entendeu que era difícil porque os nossos adversários eram os veteranos - e no wrestling, és ensinado a ouvir as pessoas que têm mais experiência que tu - mas os estalos foram para nos inspirar a desafiar o sistema. A intenção era transferir o seu espírito de luta para nós, um costume comum no seu dojo (pessoas alinhadas para serem esbofeteadas por Inoki) e na cultura Japonesa. Na verdade, ele podia apenas tê-lo dito em vez de nos dar um estalo, e teria sido igualmente eficaz.

Após o fracasso no Tokyo Dome, em vez de voar de volta para Los Angeles com o resto da malta, voei para Londres para uma oportunidade de trabalhar com o promotor Inglês de longa data Brian Dixon. Durante um tempo, Regal tinha estado a pressionar Dixon para me levar, mas o Brian preferia usar Americanos maiores porque davam óptimos vilões. Por cima disso, com lutadores Ingleses estando típicamente entre os mais pequenos, automaticamente colocava-os no papel de underdog, pelo qual a plateia podia torcer. Obviamente eu não era muito grande e, apesar de ter desenvolvido uma reputação de bom wrestler, eu não era grande personagem que fosse apelar à base de fãs de Dixon. Finalmente Dixon concordou em dar-me uma oportunidade de actuar para a sua companhia, a All Star Wrestling.

Para a maioria dos Americanos a visitar, Dixon não pagava os voos. Eu não era excepção. Felizmente, a New Japan não se importou de me colocar no voo para Londres e eu achei que podia simplesmente ficar até conseguir outra digressão no Japão ou até uma companhia Americana estivesse disposta a pagar o meu voo de regresso, que eu não antevi como sendo grande assunto. Dixon também não trataria da maioria dos vistos de trabalho do talento e, de novo, eu não era excepção. Quando falei com ele ao telefone, ele não achou que fosse caso para preocupação, e instruiu-me a dizer a qualquer um que perguntasse que eu estava apenas a visitar amigos.

Após aterrar na Inglaterra, eu tive que passar pelo departamento de imigração antes de poder buscar os meus sacos. O agente da imigração perguntou-me o que eu lá estava a fazer e, como instruído por Dixon, eu disse, "Ah, apenas a visitar amigos." "Quais amigos?" perguntou ele.

Imediatamente comecei a ficar nervoso porque não era lá muito bom mentiroso. Dei-lhe o nome do Brian Dixon. Após ele pedir a sua informação de contacto, forneci-lhe o número de telefone também.

"Por quanto tempo ficas?" perguntou ele.
"Alguns meses."
"Tens um bilhete de retorno?"
"Ainda não. Ia arranjar um."
"Quanto dinheiro tens contigo?"
"Cerca de quatrocentos dólares." (Isto captou-lhe a atenção imediatamente.)
"Então, o que vais fazer por dinheiro nos meses que cá estiveres?"

Claramente 400$ não seriam suficientes. Se eu tivesse sido um mentiroso melhor, podia ter inventado algo facilmente, como que me seria transferido dinheiro de fora quando estivesse a escassar. Em vez disso, batalhei para conseguir uma resposta e, por esta altura, já estava a suar. O agente de imigração podia notar.

Ele trouxe outro agente e interrogaram-me ainda mais. Durante o questionário, trouxeram o meu saco da bagagem e, enquanto o revistavam, encontraram o meu equipamento de wrestling. Eles perguntaram-me o que eu estava a fazer no Japão e eu contei-lhes.

"E tens a certeza que não estás aqui para lutar?" inquiriram eles.
"Nope," disse eu, "só estou cá de visita." Mesmo que eu já notasse as coisas a não correr bem, ia manter a minha história.

Devem ter feito alguma investigação sobre o Dixon e descobriram que ele era um promotor de wrestling. Ligaram a Dixon a perguntar-lhe se me conhecia. Inicialmente ele mantinha a história de que eu estava na Inglaterra de visita, mas a certo ponto mudou a cantiga e chibou-me. Quando o agente voltou disse-me, "Só para que saibas, vamos deportar-te. O teu amigo contou-nos que ias trabalhar como personal trainer."

Meteram-me numa sala com uma data de outras pessoas para ser deportadas e eu era o único Americano. Estavam todos a olhar para mim, a pensar que eu devia ter feito algo mesmo mau se eu era um Americano a ser deportado. Não era propriamente o caso. Eu era apenas um gajo de vinte-e-um anos sem grande plano. Para tornar a questão um pouco mais stressante, aprendi que quando te deportam, não te mandam de volta para o teu país-natal - deportam-te de volta para o país de onde vieste. Eles iam mandar-me de volta para o Japão! Teria que comprar o meu próprio bilhete para os States se quisesse ir para lá.

Deixaram-me ligar à minha mãe e, após contar-lhe a situação, ela e a minha irmã começaram a pesquisar por todas as opções de voo na Internet. Tudo o que conseguiam encontrar custaria milhares de dólares para me mandar de volta para os Estados Unidos dentro do tempo que eu tinha, e não me era permitido sair do aeroporto. Voar de volta para o Japão e depois ir para os States a partir de lá não era propriamente mais barato e era uma viagem bastante longa. Estava a começar a desesperar quando falei com uma agente da British Airways. Todo o tempo tínhamos estado à procura de um bilhete só de ida. Ela decidiu procurar por um bilhete de ida-e-volta e encontrou um que não estava disponível online, directo de Heathrow para LAX por apenas 500$. Nem conseguia acreditar na sorte que tinha.

Pouco depois de ter voltado aos States, entrei em contacto com Brian Dixon. Ele disse-me que se eu ainda quisesse lutar na Inglaterra podia, e desta vez ele conseguir-me-ia o visto de trabalho. Podia notar que ele se sentia mal em relação a toda a situação, especialmente porque ele sabia que eu tinha uma relação próxima com o Regal. Eu tinha comprado um bilhete de ida-e-volta, logo ainda tinha o voo de retorno e como não tinha qualquer show agendado porque tinha planeado estar na Inglaterra este tempo todo de qualquer maneira, disse-lhe que ia. Fui de carro até Aberdeen, de Santa Monica (Eu não sabia quanto tempo ia ficar na Inglaterra, quanto mais antecipar toda uma estadia de seis meses), depois tornei a atravessar o Atlântico a voar nesse mês de Maio.

Surpreendeu-me que eu não tivesse tido problemas a entrar na Inglaterra a segunda vez. Quando cheguei, o agente de imigração deu uma vista de olhos ao meu passaporte e perguntou se eu já tinha sido deportado. Contei-lhe uma breve versão da história, que não incluía eu a tentar mentir para entrar no país, e mostrei-lhe o meu visto de trabalho. Felizmente, pude entrar e, desde então, nunca tive problemas a entrar ou a sair da Inglaterra.

O meu primeiro dia em Inglaterra foi interessante. Eu tinha voado para o Aeroporto de Heathrow e tinha um espectáculo nessa mesma noite. Brian disse-me o nome do edifício e a morada, mas estava por minha conta para realmente lá chegar. O show era no Fairfield Halls em Croydon, que era perto de Londres. Eu não fazia ideia como lá chegar ou de como usar o sistema de transporte Inglês. Nunca tinha vivido num lugar onde a infraestrutura do transporte público fosse suficientemente boa para ser útil. Se não fosse pela simpatia de estranhos aleatórios a quem pedia direcções, eu podia ainda andar perdido por Londres até hoje.

Quando finalmente cheguei a Fairfield Halls, por volta das 16:30, descobri que o Brian lhes tinha dito que eu estaria ali cedo e que tinham um quarto sossegado com uma pequena cama, no andar de cima, para eu dormir uma sesta. Adormeci rapidamente e não acordei até ouvir a bater na porta por volta das 19:00. Era a filha de Dixon, Laetitia, a quem todos chamávamos apenas "Tish", e ela muito educadamente me disse que o espectáculo começava em meia hora. Enquanto me dirigia ao balneário, alguém me informou que eu fazia parte de um torneio para coroar um novo Campeão de Pesos-Médios e que iria ter três combates, todos contra gajos que nunca tinha conhecido antes e sobre os quais nada sabia.

Com muito pouco tempo antes da hora do espectáculo, fiquei um pouco nervoso. À pressa, fui até ao andar de baixo e dei lá uma volta a apresentar-me. Estava a dizer olás e a apertar mãos quando notei três gajos meios "acorrentados" uns aos outros. O Gajo #1 segurava o Gajo #2 enquanto o Gajo #3 o esbofeteava. Parecia-me só que eles estavam na brincadeira, então continuei a apertar mãos, ri-me da cena e depois saí para a sala seguinte.

Nessa noite, segui para vencer o torneio e o título de Pesos-Médios. A parte mais fixe foi ser presenteado com o título por Mark Rocco, que era famoso por ser o Black Tiger original no Japão. Rocco também fazia parte de um pequeno grupo de tipos que revolucionaram o wrestling no final dos 70s e início dos 80s ao criar um híbrido de estilos Mexicano, Japonês e Inglês em ringue. Se fores ver combates do Rocco daquela altura, eles ainda são emocionantes hoje.

O que foi incomum nessa noite, porém, foi que durante o espectáculo inteiro, pessoas persistiam em pedir-me desculpas. Não fazia ideia porquê; eu achava que era porque tinha que fazer três combates logo depois de um longo voo.

"Desculpa Bryan, Este tipo de coisa nunca acontece aqui," alguém diria.
"Sem preocupações. Isto acontece constantemente nos Estados Unidos," responderia eu, e seguia à minha vidinha.

Descobri mais tarde que eles não estavam a falar sobre os três combates. Após o espectáculo, apanhei boleia de um árbitro chamado Mal para a cidade seguinte, e ele voltou a pedir-me desculpa. Eu expliquei-lhe que múltiplos combates de wrestling não eram grande assunto para mim, visto que torneios assim eram muito populares nos Estados Unidos e eu normalmente acabava num torneio quase todos os meses em algum lado. Ele olhou para mim confuso. Depois ele apercebeu-se que eu não sabia o que se tinha passado. Ele explicou que os três gajos amontoados que eu pensava que estavam na brincadeira antes no balneário, não estavam. Afinal o Gajo #1 e o Gajo #3 (parentes de uma actual WWE Diva) estavam mesmo a dar porrada no Gajo #2. O que entendi é que eles ameaçaram atirá-lo da janela do balneário, que era num quarto andar. Felizmente não o fizeram.

A minha resposta foi simples: "Puta merda! Como é que eu perdi isso?!"
E assim acabou o meu primeiro dia na Inglaterra.

(...)

No próximo capítulo: As coisas já estão bastante interessantes e ele ainda agora chegou à Inglaterra! Acho que podemos todos adivinhar quem são os pelintras, pelo parentesco, não podemos? Bom, na próxima semana conclui-se o décimo capítulo e temos mais aventuras na Inglaterra! Isto não deixa de ficar excitante!

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