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Opinião Pacifica #8 - Os Jovens Leões



Bons dias caros leitores do Wrestling Noticias e sejam bem-vindos a mais um Opinião Pacifica. Ora, esta semana devem estar todos à espera que eu volte a falar de uma companhia independente, mas a verdade é que eu quero ir por outro caminho.

A semana passada falei sobre a PROGRESS Wrestling, sobre a progressão natural do booking da companhia e sobre como esta é especialista em construir estrelas para o futuro, tanto da própria, como da cena independente britânica e, em certos casos, mundial. E esta temática, de construir o futuro, é algo bastante interessante, se pensarmos bem.

Hoje em dia, são várias as teorias sobre por onde passa o futuro do pro wrestling mundial. Se forem adeptos de WWE, ou se se chamarem Paul Levesque, a futuro passa pelo NXT (e, inevitavelmente, pelo Performence Center). Se forem adeptos de um produto mais alternativo, das indys, por exemplo, podem muito bem dizer, com argumentos e exemplos fortes a sustentar a vossa afirmação, que o futuro passa pelo wrestling independente. Mas existe algo, um lugar, que eu, enquanto fã de wrestling, não oiço ser referido muitas vezes e, na minha modesta opinião, tem sido a escola de wrestling que mais estrelas, de maior qualidade e que, mais sucesso têm tido, tem criado desde… bem, podemos afirmar nas últimas décadas.


Estou a falar da New Japan Dojo e do sistema de Young Lions da companhia nipónica. Passando algo desapercebida para alguns (e aposto mesmo que alguns nem saibam da existência desta plataforma de treino), o Dojo da NJPW tem sido um dos maiores criadores de talento a nível mundial. Se pensarem nos grandes talentos japoneses da actualidade, como Kazuchika Okada, Hiroshi Tanahashi, Tetsuya Naito ou Shinsuke Nakamura, todos vieram do Dojo da NJPW. Mesmo nomes como Finn Balor ou lendas como Jushin Thunder Liger, fizeram a sua formação de wrestling nesta “escola”.

Ora, e vocês dizem, o que uma escola de wrestling no Japão tem de tão diferente de uma escola de wrestling nos estados unidos, como, por exemplo, o Performence Center?

Acho que, primeiro de tudo, vale a pena evidenciar algo: o PC não é uma escola de Wrestling. Como eu já falei no meu artigo de regresso ao Wrestling Noticias, a WWE não é uma companhia que tenha o wrestling como o seu principal foco (sendo este, o tão falado Sports Enterteinament), por isso, não faz qualquer sentido que o centro de treinos destes seja virado para ai. O PC é totalmente virado para o lado do entretenimento do wrestling. Por exemplo, uma das primeiras coisas que os alunos do PC fazem quando lá chegam, é trabalho de personagem. Escolherem a sua persona in wrestling, trabalharem os seus maneirismos, o seu mic work, e esse tipo de componentes que, são obviamente importantes, num produto formatado para a televisão norte americana.


Mas e no Japão? E na NJPW em que o produto deles é a competição desportiva do wrestling? Bem, aqueles que conhecem minimamente o que é o New Japan Dojo, sabem das histórias. A educação no Japão é muito diferente da educação no resto do mundo. Muito mais disciplinada, muito mais virada para o respeito pelos antigos, para a humildade enquanto individuo, para a união enquanto grupo. Tudo ferramentas que ajudam a organizar a sociedade japonesa e que reflectem-se nestes Dojos.

Uma das principais tarefas de quem frequenta o Dojo da NJPW é a limpeza do mesmo. Exato, leram bem. São os alunos, as pessoas que lá estão a estudar e a treinar para ser os próximos grandes wrestlers, que limpam o dojo, cozinham para eles e para os mais velhos, que lavam a roupa, que a estendem, tudo. Por isso, sim, pessoas como o grande Kazuchika Okada ou o ace Hiroshi Tanahashi, tiveram que cozinhar e lavar a roupa dos seus treinadores, antes de tornarem-se quem são.

Quando um aluno entra para o Dojo da NJPW, é chamado de Young Lion, nome que deriva do símbolo da companhia, um leão. Por isso, estes estudantes são os jovens leões que mais tarde se tornarão as estrelas da companhia. E os Young Lions são todos iguais, em todos os aspectos, tirando os físicos e o próprio nome. Quando começam, os Young Lions vestem todos os mesmos trunks pretos, as mesmas botas pretas, as mesmas joelheiras pretas e têm todo o mesmo moveset: clothesline, bodyslam, algumas holds e um boston crab como finisher, mais algumas moves básicas e pronto. Não passa disso.



E isto porquê? Porque é imensamente importante, para um wrestler que quer ter aspirações de se tornar um dos melhores do mundo, que é exactamente isso que a NJDojo fabrica, os melhores wrestlers do mundo, aprender os básicos, solidifica-los e mecaniza-los até que saiam da forma mais natural possível. Nada de moves excêntricas, nada de gimmicks, nada de vitórias. Primeiro, é trazer tudo ao básico e fazer os young lions perder todo o tipo de ego que têm, para poderem crescer humildes e conhecedores da arte que praticam, o wrestling.

Algo positivo a cerca do Dojo da New Japan é o facto de preparar os wrestlers para os falhanços e para os tempos duros do futuro. Como fãs de wrestling, sabemos que nem sempre, todos os wrestlers podem ter destaque ao mesmo tempo. Apesar de merecem, muitos acabam por ter que deixar o spotlight em detrimento de outros e isso, por vezes, para alguém que treina e luta há anos, que, por vezes dedicou quase uma vida inteira ao desporto e à companhia em que está, ter que dar um passo atrás para dar espaço a outros para brilhar, é um processo complicado de digerir e o Dojo ensina isso mesmo.

Se por um lado, no início da tua carreira, és “humilhado” com constantes derrotas, com a falta de identidade, com limitações em ringue e falta de oportunidade para brilhar, a verdade é que assim que acaba o teu tempo de Young Lion e vais em excursão, tudo muda.


A NJPW tem montes de parcerias por todo o mundo, desde o méxico, passando pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido. E não é à toa. Se por um lado estas parcerias ajudam a aumentar a influência e a fama da companhia por todo o mundo, por outro lado, são mais spots em que se pode mandar os jovens lutadores e futuras estrelas da companhia para poderem amadurecer e desenvolver uma personagem que, irá, ser a que irão envergar no futuro quando voltarem à companhia. Pelo menos, uma versão desta.


As experiências de maior sucesso recentemente foram as excursões de Hiromu Takahashi na CMLL (e um tempo na ROH) e de Jay White na ROH. Ambos os lutadores ganharam credibilidade em ringue durante o seu tempo nas companhias em que estiveram, desenvolveram um protótipo de personagem (no caso de Takahashi, com a personagem de Kamaitachi, e no caso de Jay White, uma espécie de versão babyface do que está agora a experimentar) e, quando voltaram à companhia, estavam prontos para envergar um papel de destaque e serem devidamente pushados.

Mesmo lutadores que podem ter passado mais desapercebidos durante as suas excursões, como foi o caso de Sho e Yo, os Tempura Boyz, acabaram por ser devidamente pushados e consolidados quando voltaram à companhia e foram transformados nas novas caras da divisão de tag jr.

E é nisso que a NJPW tem tanto sucesso. Se por um lado, não existe grande continuidade entre aquilo que os lutadores fazem durante a excursão e a sua volta à companhia, pois as suas personagens são mudadas, por vezes, de forma dramática (basta ver o que aconteceu, por exemplo, com Kazuchika Okada que, na TNA, estava a ser tratado de forma horrivelmente má, sendo um jobber e um sidekick de Samoa Joe e, quando voltou para a companhia, tornou-se imediatamente numas das estrelas e caras da mesma), por outro lado, acontece algo que não tem acontecido na WWE: a aposta nas suas estrelas, de forma coesa e coerente, de forma a que, não só fiquem estabelecidos com os fãs, mas com os outros lutadores também, o que é bastante mais importante do que aparenta ser à primeira vista.

Por isso é que é completamente coerente um jovem como Jay White, que ainda agora regressou à companhia e, apesar de uma excursão bastante interessante debaixo da alçada da ROH, nunca foi o tipo de lutador que se achasse que pudesse ser uma das caras da companhia, enfrentar uma das maiores estrelas do momento, senão, de sempre mesmo, do Japão, sem que as pessoas contestem o booking ou o valor do lutador para merecer estar naquela posição. Jay White está mais que preparado para entrar, no dia 4 de Janeiro, no Tokyo Dome e enfrentar Hiroshi Tanahashi, pelo título Intercontinental da IWGP, sem ter medo de estar “pronto para isso”, porque ele sabe que está, a companhia sabe que ele está e, mais importante que tudo, os fãs sabem que ele está.


Se atravessarmos o oceano (e um continente) e vermos o que acontece na companhia de Vicent K. McMahon, é algo completamente diferente. Todos sabemos os graves problemas que existem a nível de continuidade entre o NXT e o roster principal da companhia. Todos sabemos o problema em aproveitar a popularidade de certos lutadores e continuar a eleva-los ao nível a que eles estavam no “território de desenvolvimento” da companhia. Todos vimos o que aconteceu a pessoas como Tyler Breeze, Tye Dillinger, aos Vaudvillans ou até a Bray Wyatt e outros tantos, que acabaram por ficar estagnados por más decisões atrás de más decisões que, em nada, eram fieis ao que os fãs tinham sido acostumados no NXT.

E isso é algo em que a NJPW é bastante boa. Se por um lado ela não ignora que os lutadores estiveram em excursão, nunca tornam isso num ponto fulcral da construção da personagem. Quanto muito, utilizam isso como forma de contar algum tipo de história (como foi o caso de Tetsuya Naito e a sua ultima excursão ao México, que fez com que este ganha-se os maneirismos dos El Ingobernables).

A NJPW apresenta os lutadores no seu início de carreira, como jovens promessas do mundo do wrestling que estão a aprender, ensinam-lhes tudo aquilo que eles necessitam para ter sucesso e mandam-nos “fora de casa”, para que possam maturar e desenvolverem-se sozinhos, de forma independente e a criarem uma identidade. Quando voltam, aproveitam todos os novos conhecimentos e a própria identidade que o lutador acumulou, limam as arestas e apresentam ao público como “aquele puto que aqui estava há uns anos e agora voltou, feito um homem”.


Desde Jushin Thunder Liger a Yuji Nagata, Hiroshi Tanahashi a Shisuke Nakamura, de Kazuchika Okada a Tetsuya Naito e, agora, de Himoru Takahashi a Jay White, a NJPW tem provas mais que dadas que o seu sistema de formação é um dos, senão mesmo o com mais sucesso do mundo. Basta ver a quantidade de lutadores que foram formadas no sistema de formação da companhia e que acabaram por ter sucesso na própria, contra os lutadores que foram formados no PC e tiveram grande sucesso na companhia. Roman Reigns pode ser a única grande exceção disso, mas mesmo assim, acho que todos sabemos de onde vem o sucesso do mesmo (posso estar aqui a esquecer-me de alguém, mas lapsos acontecem).

Mas também temos que ser condescendentes em algo: O Dojo da NJPW existe há décadas, desde os anos 70 pelo menos. O PC existe há sensivelmente, quatro anos. Obviamente que ainda existe uma grande estrada e muitas melhorias a fazer em todos os níveis no sistema de formação da companhia, mas se querem utilizar as fantásticas condições que têm de forma a potenciar as jovens promessas que saem de lá, acho que dar uma vista de olhos à forma que as coisas são feitas em terras do império do sol, não seria, de todo, uma má ideia.

E este foi, meus amigos, mais um Opinião Pacifica. Espero que tenham gostado do tema desta semana, foi algo diferente mas acho que deveria ser abordado, não só porque notei que muita gente, mesmo quem conhece e vê wrestling há bastante tempo, não tem ideia do que é isto do Young Lions System, como para expor-vos a vocês os grandes feitos que este sistema tem feito ao longo dos anos.

Espero-vos aqui para a semana, no mesmo local do costume, as horas ainda a determinar e, o tema, ainda por decidir. Espero ver-vos no próximo Opinião Pacifica e não percam o próximo episódio, porque nós… TAMBÉM NÃO! PEACE!
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